quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Liberdade


Nos meus cadernos de escola
Sobre a carteira nas árvores
Sobre a neve sobre a areia
Eu escrevo o teu nome
 
Em todas as páginas lidas
Em todas as páginas em branco
No papel na pedra ou na cinza
Eu escrevo o teu nome
 
Sobre as imagens douradas
Sobre as armas dos guerreiros
Sobre a coroa dos reis
Eu escrevo o teu nome
 
Na selva e no deserto
Sobre os ninhos sobre as giestas
Nos ecos da minha infância
Eu escrevo o teu nome
 
Nas maravilhas das noites
No pão branco das jornadas
Nas estações de noivado
Eu escrevo o teu nome
 
Nos fiapos de azul-celeste
No imóvel disco solar
No lago da lua vibrante
Eu escrevo o teu nome
 
Nos campos nos horizontes
Nas asas dos passarinhos
Sobre os moinhos de sombras
Eu escrevo o teu nome
 
Em cada sopro de aurora
Sobre o mar sobre os navios
Na insensatez das montanhas
Eu escrevo o teu nome
 
Nas nuvens soltas e revoltas
Na tormenta transpirada
Na chuva insistente e tola
Eu escrevo o teu nome
 
Sobre as formas cintilantes
Nas campânulas de cores
Por sobre a verdade física
Eu escrevo o teu nome
 
Sobre as veredas despertas
Nos caminhos desdobrados
Sobre as praças transbordantes
Eu escrevo o teu nome
 
Na lâmpada que se acende
Na lâmpada que se apaga
Nas casas cheias de gente
Eu escrevo o teu nome
 
No fruto cortado em dois
O do espelho e o do meu quarto
Na concha do leito vazio
Eu escrevo o teu nome
 
No meu cão terno e guloso
Mas sempre de orelha em pé
E patas destrambelhadas
Eu escrevo o teu nome
 
Na soleira da minha porta
Nos objectos familiares
Nas chamas do lume sagrado
Eu escrevo o teu nome
 
Em toda a carne acordada
Na fronte dos meus amigos
Em cada mão que me afaga
Eu escrevo o teu nome
 
Na vidraça das surpresas
Sobre os lábios expectantes
Muito acima do silêncio
Eu escrevo o teu nome
 
Nos refúgios descobertos
Nos meus faróis em ruinas
Nas paredes do meu tédio
Eu escrevo o teu nome
 
Sobre a ausência do desejo
Sobre a solidão desnuda
Nos descaminhos da morte
Eu escrevo o teu nome
 
No retorno da saúde
No risco que se correu
Na esperança sem lembrança
Eu escrevo o teu nome
 
E pelo poder de um nome
Começo a viver de facto
Nasci para te conhecer
E te chamar
 
liberdade

Paul Éluard

Sem comentários:

Enviar um comentário